domingo, 8 de junho de 2025

Pastel zone

Nunca tinha andado sobre lápides tão festivas. Azuis e rosas em tons pastéis pintados sobre camadas grosseiras de cal - talvez - davam às cores um ar tridimensional de cobertura de bolo. 
“Um cemitério ao longo da rua” - pensei, observando que aquela provavelmente era a unica rua da cidade. Casinhas emendavam-se umas às outras tanto ao lado esquerdo - do mar, e do grande penhasco - quanto ao lado direito - montanhoso e sem fim.
Curiosamente, as lapides, construídas em alvenaria e com uma altura que não ultrapassava um metro, ou metro e meio, emendavam-se como as casinhas, umas na outras, separadas apenas pelas cores - e pelos mortos diferentes, claro - ao longo do comprimento da rua.
Era como se houvesse a via dos mortos - um longo canteiro central - circundada pela dos vivos, onde mulheres de saias longas e compridas circulavam de chinelos, com tachos apoiados na cintura.
À certa altura, desviei o corpo de uma grande cruz erguida entre alvenarias, para homenagear alguem que imaginei ser importante. Procurei a inscriçao e li abismada “Monteiro Lobato”? A estranheza me fez levantar o olhar adiante.
O mar silencioso brilhava sob o sol, lá abaixo do que pareciam ser quilómetros de uma descida ingrime de rochas. Monteiro Lobato foi instantaneamente pulverizado.
Vi duas mulheres conversando sobre algo que nao conseguia escutar. Suas saias compridas estufadas com o vento e a terra quente que ele levantava. Pareciam nao se importar com o fato de que eu andava sobre as lápides, bem acima delas, como se andasse numa calçada qualquer.
Essas pinturas parecem ter sido retocadas infinitas vezes, e nao consigo deixar de visualizar meus tenis arrancando um grande naco delas, e este voando em uma parabola descedente ate espatifar-se no chão.
De repente noto, sob os mesmos tênis: uma lápide verde-agua. Que linda!
Sigo, sem nunca tirar os Chuck.

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