Aos domingos a cabeça se enxe de vozes.
As folhas deslizam como ratinhos, fugindo em bandos da tempestade.
Uma bruxa me apresenta uma criatura, dizendo-me ser “sua criatura”. Empurra em minha direção, sobre a mesa, uma estatueta representando a besta quadrúpede com cabeça de harpia, garras, patas e escamas de dragão.
O sol quase beija o mar infinito, e antes que mergulhe nas aguas misteriosas, despeço-me com agonia da feiticeira cigana.
A descida nas escadas em voltas de lances sem fim também me dizem que o tempo acabou.
Começo a cantar. No início surpresa, pois sequer sei o que canto - escuto minha melodia preenchendo as paredes de pedra. E entao, tritões e sereias passam a entoar, junto a mim, o cantigo de adoração religiosa.
Nao entendo o que canto, ou como canto, mas cada fibra do meu ser sabe que esta é a única arma que tenho.
A musica divina me faz transcender, e passo a contemplar duas cenas ao mesmo tempo: a mim mesma, apavorada nas escadarias duma torre, e o mar lá fora a rodeá-la; sob o céu alaranjado, suas águas quase negras arrepiando-se, perigosamente elétricas, cravejadas com as faces dos filhos de Anfitrite.
O cheiro de morte paira no ar.
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